Nos últimos anos, alguns jogos de puzzles conseguiram impressionar-nos com o seu sentido de revelação; a sensação de descoberta que vai além da solução de um puzzle, ou de um ponto crucial da história. Mais intrigante ainda é a forma como isso pode ser manifestado através de uma experiência interativa, e quando o progresso num jogo quase parece o mesmo do que chegar a uma realização importante, é impossível não manter esse jogo no pensamento muito além de ser terminado.
Um dos melhores exemplos disso é The Witness, uma obra prima, na nossa opinião, mas há um jogo mais recente que merece igual atenção, embora tenha sido ignorado por muitos, inclusivamente o Gamereactor. Gorogoa foi lançado há quase um ano, mesmo no final de 2017, e por causa disso mesmo, passou despercebido. É uma pena que isso tenha acontecido, mas aqui estamos para corrigirmos esse erro na parte que nos toca, com uma análise ao jogo.
Gorogoa foi originalmente lançado para PC, iOS, e Android, um pouco mais tarde chegou à Nintendo Switch, e alguns meses depois foi também adaptado à PS4 e à Xbox One. Para começar, podemos dizer que Goroga funciona bem em qualquer formato, seja com comando, rato e teclado, ou ecrã tátil, e tem bom aspeto, seja num ecrã de dimensões reduzidas, ou numa grande televisão.
Enquanto jogo de puzzles, a sua jogabilidade envolve manipular quatro blocos que formam um quadrado. O objetivo, por regra, passa por manipular as imagens de forma a que as extremidades se toquem, formando uma única imagem. Não é, contudo, tão simples quanto rodar os blocos. Precisam de fazer zoom ou afastar a câmara, retira blocos que deixam no seu lugar formas, ou mudar os blocos de posição.
Existem mais ações para descobrirem, mas o grau de complexidade aumenta de forma gradual, introduzindo elementos em movimento, truques de escala e perceção, ou acrescentando várias camadas à imagem de um bloco. Pode ser um pouco confuso perceber como funciona apenas lendo estas linhas, por isso aconselhamos-vos a espreitarem os vídeos que acompanha o artigo, já que fazem um trabalho bem mais competente de mostrar como funciona. Também gostámos que, em vez de ser um processo de tentativa e erro, Gorogoa envolve antes um processo de observação e escrutínio que apreciámos bastante.
Gorogoa tem uma história, mas conta-a utilizando apenas elementos visuais, sem qualquer indício de texto. Isto tem o seu lado de risco, já que pode ser confuso, e talvez deixe demasiado à interpretação dos jogadores para os gostos de alguns, mas nem tudo é ambíguo, já que existe uma estrutura, um tema, e um fio condutor bem definidos.
Não são precisos muitos minutos para se perceber que Gorogoa é um jogo sobre a procura eterna da divindade, e do significado da vida. Este conceito, contudo, e os elementos a ele associados - que por vezes são muito explícitos, noutros são muito soltos -, podem ter muitos significados diferentes, dependendo de cada jogador e as suas crenças. E isso acaba por ser determinante para o investimento emocional de cada um.
O protagonista passa a sua vida toda à procura de respostas, colecionado na sua tigela os cinco frutos que o podem levar a um esclarecimento divino, ou pelo menos o suficiente para se sentir realizado e em paz. Cada fruto tem uma cor, um tópico, e está associado a um capítulo. Isto significa que o jogo está dividido em cinco partes, por onde o jogador irá viajar através dos painéis, das eras, e de eventos mundiais. Como já referimos, nem todos os jogadores vão ter isso tudo de ligação, mas as revelações do jogo são algo que, acreditamos, vai dizer imenso à maioria dos jogadores que o jogarem.
O estilo visual de Gorogoa é um misto entre a arte que normalmente associados a contos de fadas, figuras geométricas, e arquitectura. Esse estilo apresenta variações, dependendo do fruto e dos tópicos. É uma forma muito eficaz de reforçar vários tipos de emoções, incluindo tensão, tanto na história, como nos puzzles. Uma queixa ao estilo utilizado é o facto de nem sempre ser claro quais são os elementos com que podemos interagir.
Jason Roberts passou cinco anos a pintar as figuras, a desenhar o jogo, e a programar Gorogoa. O resultado é um jogo que, embora curto (três a quatro horas), proporciona uma das experiências de puzzles mais singulares e especiais dos últimos anos, mesmo considerando a grande qualidade que o género tem conhecido ultimamente. E mesmo que nunca cheguem a ter um momento de "revelação" enquanto jogam Gorogoa, é fácil apreciar o jogo apenas pelo design dos puzzles e a beleza da arte.